ARTIGO: Cirurgia Segura

Por Marta Ferreira Passo*

A imprensa tem noticiado, frequentemente, situações dramáticas ocorridas em instituições de saúde, em que erros aconteceram durante cirurgias, ou em outros procedimentos invasivos.

Em 2014, o Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC) divulgou o Manual de Cirurgia Segura, contribuindo para que hospitais brasileiros implementassem o Programa de Cirurgia Segura. O órgão também publicou dados demonstrando que: complicações pós-operatórias em pacientes internados ocorrem em até 25% dos pacientes; em países desenvolvidos, cerca de metade de todos os eventos adversos em pacientes hospitalizados estão relacionados à assistência cirúrgica, e nos casos onde o processo cirúrgico levou a prejuízos, ao menos metade deles era evitável; e ainda, que princípios conhecidos de segurança cirúrgica são aplicados de maneira inconsistente, mesmo nos cenários mais sofisticados.

A Joint Commission International (JCI) recomenda, através de padrões centrados no paciente, que hospitais implementem a Meta Internacional de Segurança do Paciente que visa “garantir o local correto, o procedimento correto e a cirurgia no paciente correto”. Este é um processo que aumenta a qualidade e segurança das cirurgias e dos procedimentos invasivos realizados em setores como hemodinâmica, radiologia intervencionista e de endoscopias.

Mas como médicos, profissionais da saúde, pacientes e seus acompanhantes podem fazer para melhorar a qualidade e ter segurança nos procedimentos realizados? Para os pacientes e acompanhantes, a recomendação é que tenham participação ativa em todo o processo assistencial, requerendo transparência nas orientações recebidas da equipe, para que possam compreender o conteúdo dos termos de consentimento esclarecido e informado que assinam antes da realização dos procedimentos e exames, bem como das orientações descritas nas receitas para o pós-alta. Para a equipe envolvida nos procedimentos, os melhores resultados dependerão do cumprimento dos processos essenciais universalmente reconhecidos, também descritos na 5ª edição do Manual de Padrões de Acreditação da JCI para Hospitais e destacados a seguir:

· Marcação do local da cirurgia (feito previamente pelo profissional que realizará o procedimento em todos os casos que envolvem lateralidade ou estruturas múltiplas, como dedos, coluna, rins, olhos, pernas e braços);

· Verificação pré-operatória (para confirmar paciente, local e procedimento corretos; garantir a disponibilidade de todos os documentos e tecnologia médica necessários);

· Realização do time out, que é um momento conduzido na sala do procedimento cirúrgico/invasivo, exatamente antes do início do mesmo e com a presença e participação de toda a equipe, para que os pontos do check list que garantirão o local correto, procedimento correto e paciente correto, sejam verificados e documentados.

E as instituições de saúde, o que têm feito?

No Brasil temos inúmeros exemplos, como campanhas nos hospitais para sensibilizar as equipes para o tema da cirurgia segura, e que tiveram depois de alguns meses de campanha adesão ao check list cirúrgico em mais de 80% das cirurgias; em outra unidade se promoveu a campanha da entrega do bisturi pelo enfermeiro ao cirurgião, somente após a conclusão do Time out. Em Belém, a coordenação de enfermagem de um centro cirúrgico instalou um quadro na entrada principal do bloco cirúrgico com os resultados crescentes do indicador de cumprimento de Time Out, após campanha iniciada durante processo de educação pelo Consórcio Brasileiro de Acreditação, com foco na acreditação pela JCI.

Como não há somente uma única solução que promoverá a melhoria da segurança cirúrgica, destacamos como fundamental o engajamento nessa causa não apenas do cirurgião, mas de toda equipe de profissionais, para que trabalhando juntos aumentem os padrões de qualidade da assistência cirúrgica prestada. Na certeza de que a ocorrência de qualquer erro pode ser devastadora para o paciente, para as equipes e para a instituição de saúde, devemos reconhecer a importância dessas barreiras de segurança que são colocadas nos processos assistenciais, para que a probabilidade de ocorrência de erros seja sempre a menor possível.

É anseio nacional que tenhamos maior qualidade e segurança na assistência à saúde do nosso povo. Para isso, cada instituição de saúde deverá efetivamente implementar o Núcleo de Segurança do Paciente, como determina a RDC nº 36 publicada em 2013 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que certamente contribuirá para reduzir danos e salvar vidas de milhares de pessoas no nosso país.

* Marta F. Passo é médica e educadora para a Melhoria da Qualidade e Segurança do Paciente do Consórcio Brasileiro de Acreditação, associado da Joint Commission International no Brasil. É especialista em Geriatria e Gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontolgoia/Associação Médica Brasileira e em Administração Hospitalar pela Universidade Federal da Bahia. Por dois anos atuou na Coordenação do Gerenciamento de Riscos da S.O.S.Vida/Bahia (recertificada pela JCI), onde exerce as atividades de Assessora de Projetos em Saúde.