Amor ao próximo acima de todos os obstáculos

Imagem: Divulgação/PMT

Em mais um texto da série de homenagens do Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC) aos médicos cirurgiões infectados pelo novo coronavírus, a história de Reginaldo Boppré, 65 anos, é daquelas que merecem ser compartilhadas para inspirar outras pessoas a não desistirem de seus sonhos. Quem relata os detalhes da vida do médico é o amigo e também cirurgião Jaime Gelosa Souza. “Ele foi um dos melhores seres humanos com quem tive a felicidade de conviver”, afirma com admiração.

Com apenas 8 anos de idade, Boppré começou a trabalhar em um posto de gasolina como frentista no interior da cidade de Tubarão, em Santa Catarina. O menino mal tinha força para levantar a bomba de gasolina, mas trabalhava para ajudar a mãe viúva e os quatro irmãos menores. Pouco tempo depois, o posto faliu e ele foi trabalhar como garçom em uma lanchonete próxima. Todo o dinheiro que recebia era para ajudar no sustento da família.

Aos 15 anos foi para São Paulo estudar. Para sobreviver, conseguiu um emprego de balconista em uma lanchonete nas proximidades do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP). “Ele trabalhava durante o dia, estudava num colégio público à noite e depois voltava para a lanchonete para limpar todo o estabelecimento em troca da hospedagem no próprio trabalho. E foi ali que surgiu o interesse pela medicina, com a admiração que teve pelos médicos e acadêmicos vestidos de branco que frequentavam o local para tomar café. Contou-me uma certa vez que foi a partir daí que teve a certeza que seria médico”, revela Souza.

Boppré fez o primeiro vestibular e, apesar de não conseguir passar em medicina, foi aprovado no curso de Farmácia. Entretanto, ele não quis iniciar a faculdade e preferiu perseverar para fazer a prova novamente no ano seguinte. No final do outro ano, pediu demissão da lanchonete em São Paulo e foi para Florianópolis se preparar para o vestibular. Além de receber o acerto do trabalho, recebeu um cheque da esposa do patrão com uma quantia significativa para ajudá-lo no período que iria enfrentar. Com o dinheiro, pagou o cursinho intensivo à vista e o restante enviou para a mãe em Tubarão. Sem lugar para dormir, encontrou uma pensão no centro da capital catarinense na qual a dona aceitou trocar a hospedagem pela faxina geral do local, realizada todos os sábados.

Todo esforço valeu a pena – o jovem passou no curso de medicina da Universidade Federal de Santa Catarina. Durante a faculdade, o estudante ia de bicicleta dar aulas nos colégios municipais no período noturno para continuar ajudando no sustento da família. Após a graduação, fez a primeira residência médica em Cirurgia Geral pelo Hospital Geral Governador Celso Ramos, em Florianópolis, e a segunda em Cirurgia Vascular Periférica e Angiologia pela Universidade de São Paulo (USP), em São Paulo, onde ainda foi acolhido pelos antigos patrões. “Ele proporcionou acesso ao estudo para todos os seus irmãos até concluírem o nível superior. Do mais velho até o mais jovem, que é o Alberto, colega de especialidade. Reginaldo Boppré foi um lutador, um homem de uma integridade incontestável, com uma força interior inexplicável. Um cirurgião de extrema habilidade, um professor nato e seu nome ficará marcado sempre por onde passou”, ressalta o amigo e colega.

Reginaldo Boppré foi infectado pela COVID-19, lutou pela vida durante 41 dias na UTI do Hospital Nossa Senhora da Conceição (HNSC), de Tubarão (SC), e faleceu no dia 29 de agosto de 2020. O médico era membro do Corpo Clínico do HNSC desde 1995, atuando como cirurgião vascular. Na instituição também foi diretor clínico de 2010-2013, prestando relevantes serviços à área da saúde e à população. Era especialista em Angiologia e Cirurgia Endovascular e Angiorradiologia pela Associação Médica Brasileira/Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular e professor de cirurgia vascular no curso de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina, UNISUL – Campus Tubarão. Além disso, realizava diversos trabalhos sociais, como atendimento gratuito aos idosos que viviam em instituições de longa permanência.

Colegas do HNSC, de Tubarão (SC), homenageiam Dr. Boppré. (Imagem: reprodução)

Os nossos sinceros sentimentos por essa perda para a medicina brasileira!