Artigo: De que, afinal, morreu Napoleão Bonaparte?

Surgiram controvérsias sobre a causa da morte do famoso imperador francês, em 1821: teria sido câncer de estômago ou envenenamento?

Napoleão Bonaparte é um dos personagens mais estudados da História. Entre os mistérios que ainda cercam sua pessoa está a causa de sua morte, particularmente a suspeita de que ele foi envenenado.

Após a derrota na Batalha de Waterloo, em 1815, Napoleão foi exilado na pequena Ilha de Santa Helena, no Atlântico Sul, onde morreu seis anos depois. Embora seu médico pessoal, François Antommarchi, tenha declarado em seu relatório de autópsia que o câncer de estômago foi a causa de sua morte, esse diagnóstico foi contestado em 1961, porque foi achado arsênico em uma das amostras de cabelo de Napoleão, sugerindo que ele tivesse sido envenenado.

Vamos rever essa história.

Nos seus dois primeiros anos de exílio, não há relato de queixas clínicas do famoso prisioneiro, mas, nos anos seguintes, sua saúde foi piorando gradativamente. O imperador, em julho de 1820, queixou-se de desconforto abdominal, causando perda de apetite, náuseas e vômitos. Houve períodos de calmaria, mas a dor e o vômito se tornaram cada vez mais frequentes. Ele perdeu pelo menos 10 kg nos últimos seis meses de vida. No final de janeiro de 1821, ele só conseguia se alimentar de líquidos. No final de abril, vomitou sangue, e sua condição piorou com mais sangramento. Ele morreu em 5 de maio, aos 51 anos de idade.

A necropsia foi acompanhada por diversos observadores, incluindo sete médicos britânicos, dos quais cinco assinaram o relatório oficial. A superfície interna do seu estômago continha sangue e uma tumoração endurecida com mais de 10 centímetros de extensão. O estômago estava perfurado, mas havia sido selado pelo fígado. A doença havia se espalhado para os nódulos linfáticos. Os achados da necropsia demonstraram que o tumor estava em estado avançado, doença incurável naquela época.

Mas, em 1982, um exame no papel de parede da casa onde Napoleão estava exilado mostrou que ele continha arsênico e, novamente, a suspeita de sua morte por envenenamento foi especulada. No entanto, a excelente revisão liderada pelo patologista forense Alessandro Lugli, publicada em 2011, corrobora que a quantidade de arsênico detectada em seu cabelo e no papel de parede de sua última moradia não seria suficiente para causar sua morte.

O Imperador iria sucumbir por um inimigo que começou a ser vencido somente com o surgimento da patologia moderna, cujo “pai”, Rudolf Virchow, nasceu em outubro de 1821; com a primeira ressecção de estômago realizada com sucesso, em 1881; com os primeiros trabalhos científicos sobre o uso experimental da mostarda nitrogenada, usado como gás letal na Segunda Guerra Mundial, como quimioterapia no tratamento do linfoma em 1946. Até então, o arsênico e o mercúrio, numa época de uma medicina empírica, eram usados como medicamentos e tônicos.

O imperador percebeu que estava morrendo da mesma doença que seu pai e seu avô, comentando: “Eu sei a verdade e estou resignado”.

O resto é fábula.

TCBC Alfredo Guarischi.

Artigo publicado na edição online do jornal Globo – Saúde em 4/12/18.