Artigo: ” Minha temperatura está normal?”

Essa é uma pergunta frequente e que precisa de uma longa resposta.

São diversas as causas de alteração da temperatura do corpo, cuja faixa de normalidade aceita é de 36°C a 37,7°C, mas que varia entre indivíduos e durante o dia, podendo ser de meio grau a menos das 2h às 8h ou subir no período das 16h às 21h; além de ligeiramente diferente quando aferida pela via axilar, oral ou retal.

Alguns pacientes afirmam que “isso para mim já é febre” estando sua temperatura na faixa considerada de normalidade; outros dizem que estão sem febre, ao colocar a mão sobre a testa. Podem ter razão, mas o correto é colher sua história clinica e mensurar a temperatura apropriadamente.

Pacientes idosos ou imunossuprimidos eventualmente não apresentam temperaturas elevadas mesmo em vigência de infecções graves, enquanto temperaturas altas podem ocorrer em crianças de baixa idade com infecções leves.
Durante grandes cirurgias ou em paciente em CTI, medimos sua temperatura de forma continua colocando um sensor especial no esôfago ou num vaso sanguíneo. Essa técnica – temperatura central – é importante no diagnóstico da hipotermia.

Devemos muito a Carl Wunderlich (1815-1877) sobre o padrão da temperatura corpórea. Professor de medicina em Leipzig, em 1871 publicou o livro Temperatura nas Doenças, no qual reuniu informações sobre 25.000 pacientes. No seu prefácio, fala de seus 16 anos de pesquisa em diversas patologias e da “firme convicção do valor desse método de investigação, pois o conhecimento do curso da temperatura na doença é indispensável, porque todos os fenômenos dos doentes são merecedores de estudo”.

Mas isso só foi possível graças ao trabalho de Daniel Fahrenheit (1686-1736), que já fabricava termômetros utilizando álcool e, depois, em 1710, aperfeiçoou esses instrumentos com o uso do mercúrio, obtendo leituras mais precisas. Por trabalhar sem proteção, morreu intoxicado por esse metal líquido.

Não há dúvida quanto ao risco do manuseio do mercúrio, do seu descarte indiscriminado ocasionando danos ao meio ambiente e do perigo especial para gestantes e crianças. Isso levou a Convenção de Minamata, assinada por 140 países, incluindo o Brasil, a proibir seu uso, incluindo nos termômetros, a partir de janeiro de 2019. Porém a qualidade questionável de alguns aparelhos digitais atualmente disponíveis preocupa, sendo fundamental avaliar sua procedência, certificações e calibração, sem esquecer de verificar se suas baterias estejam carregadas.

Devemos continuar a adotar medidas simples, como a medição da temperatura corporal, que permanece como um parâmetro importante há mais de três séculos, apesar de nesse período ter havido tantas mudanças na medicina.
Como sabiamente afirmou Wunderlich, “embora questões teóricas sobre temperatura humana e assuntos afins não devam ser negligenciadas, a temperatura pode ser determinada com precisão e não pode ser fingida nem falsificada”.

TCBC Alfredo Guarisch

Artigo publicado no jornal O Globo na edição do dia 29 de agosto.