O paciente, o cirurgião e o robô

Quem opera é o cirurgião e não o robô, que custa em torno de 3 milhões de dólares, estando a maioria desses equipamentos instalada em hospitais privados, do Rio de Janeiro e São Paulo.

O cirurgião é treinado para cuidar do paciente, removendo ou substituindo órgãos doentes, rejuntando vasos e canais, sempre buscando evitar infecções. Uma missão artesanal, mas baseada na melhor evidência científica.

Essa história vem sendo escrita por séculos e, graças à anestesia, aos cuidados clínicos e à ajuda de diversos outros profissionais de saúde, o avanço científico tem sido acelerado a partir da segunda metade do séc. 19.

As incisões e os instrumentos vêm ficando cada vez menores e mais precisos. Microscópicos e câmeras especiais permitem cirurgias com uma incisão mínima. Quando bem indicadas e realizadas num hospital aparelhado e por uma equipe experiente, ajudam a reduzir a dor pós-operatória, a perda de sangue e o tempo de recuperação.
A cirurgia com auxílio do robô associa tecnologia e software, ajudando o cirurgião a controlar com precisão os instrumentos cirúrgicos ligados aos braços mecânicos, visualizando o local da cirurgia em alta definição tridimensional.

Quem opera é o cirurgião e não o robô, que custa em torno de 3 milhões de dólares, estando a maioria desses equipamentos instalada em hospitais privados, do Rio de Janeiro e São Paulo. O custo do material utilizado em cada cirurgia varia entre 4 e 6 mil dólares e não é pago pelos planos de saúde, pois esses procedimentos não foram ainda homologados pela Agência Nacional de Saúde. Essa equação inviabiliza o acesso ao método para a maioria da população, atrasando o conhecimento da real vantagem e dos riscos dessa nova tecnologia.

No Brasil há ainda uma importante questão sobre quem pode realizar a cirurgia robótica. O hospital proprietário do equipamento é quem indica o profissional para o treinamento. Dessa forma o monopólio da indústria, dona da única marca disponível em nosso país, contribui para o atraso na aquisição de habilidade de um maior número de cirurgiões com essa tecnologia. Não tenho dúvida de que nossas sociedades cirúrgicas estão capacitadas para essa missão e estão se mobilizando para isso ocorrer.

Os cirurgiões passam por uma curva de aprendizado que se inicia no treinamento em plataformas virtuais. Posteriormente há necessidade do recém-certificado ser supervisionado por um proctor – um cirurgião mais experiente – por um certo número de cirurgias, que vai variar conforme sua adequação a esse novo método de operar. Há também a necessidade de o hospital ter uma equipe técnica e de enfermagem especificamente treinada.
Em fevereiro de 2019 o FDA americano, que tem o papel semelhante de nossa ANVISA, emitiu um comunicado sobre a segurança e a eficácia do uso de robô em cirurgias de câncer de mama e de útero. No mesmo sentido outras publicações especializadas apontam resultados controversos sobre o resultado da cirurgia por vídeo ou robótica em tumores do pâncreas, quando comparado com o realizado pela via tradicional.

A medicina continua sendo uma ciência de verdades passageiras.

Eventuais conflitos de interesse em relação a novas tecnologias precisam ser informados ao paciente, de forma objetiva, assim como deve ficar claro que tratamentos tradicionais, cirúrgicos ou clínicos, continuam sendo válidos.

TCBC Alfredo Guarischi –  Artigo publicado na edição online do jornal O Globo – 04/06/2019.