Unha encravada ou onicocriptose?

Conselho Federal de Medicina acaba de publicar livro que discute diversas situações em que termos médicos são rejeitados ou estigmatizados

É a mesma coisa. Onicocriptose vem do grego “onyz” (‘unha’) e “krytos” (‘escondida’), portando uma unha escondida (encravada).

A criptografia (‘grafia escondida’) é uma forma de comunicação que impede que os que não dominem seus protocolos a compreendam. Algumas vezes a comunicação jurídica, econômica e médica parece formas específicas de criptografia.

Bons linguistas afirmam que todas as formas existentes na língua são importantes, mas o idioma apresenta constantes mutações. A medicina, que é um tema que está diariamente na mídia, precisa manter esse dialogo de forma sempre clara, que suscite menos crítica de leitores ou ouvintes. Frequentemente, acha-se estranha a forma culta e adequada de certos termos e prefere-se a forma popular.

O Conselho Federal de Medicina acaba de publicar e disponibilizar gratuitamente na rede o excelente livro “Expressões médicas”, do Dr. Simônides Barcelar e colaboradores. Numa longa jornada que começou nas apresentações de artigos por acadêmicos de medicina no Centro de Pediatria Cirúrgica do Hospital Universitário, na Universidade de Brasília, os professores constataram a existência de atitudes inadequadas a um linguajar médico. Uma lista de expressões médicas errôneas deu origem a diversos artigos científicos sobre o tema que culminaram nesse livro.

Nele estão compilados inúmeros termos utilizados em hospitais, ambulatórios, consultórios e trabalhos científicos. Discute, com um acessível rigor médico e linguístico, diversas situações em que termos são rejeitados ou estigmatizados.

Quando uma palavra é usada por todos, mesmo inadequadamente, com o tempo poderá ser considerada legítima, porém somente será incluída na linguagem culta após ser estudada e legitimada por especialistas em letras. Ainda hoje, numerosos termos difusamente disseminados não foram oficialmente codificados, e o uso de curtas mensagens eletrônicas por dedos e mentes “nervosos” estão criando dialetos criptografados.

Medicina é uma ciência de verdades passageiras, e, assim, uma comunicação médica inadequada pode resultar em problemas físicos, emocionais e até legais.

Para que não haja equívocos, os autores recomendam a escolha de termos simples, exatos e claros; não deve haver certo ou errado, e sim adequado ou inadequado; permitir flexibilidade; usar preferencialmente vocábulos em português; reduzir ao máximo o número de abreviaturas, perigosas até para artigos científicos, e evitá-las na comunicação com o público leigo.

Imaginar que o significado da palavra técnica está subentendido é uma armadilha em que médicos e pacientes caem, por isso ambos precisam de tempo para se comunicar e nivelar suas dificuldades linguísticas.

A essência da oportuna obra “Expressões médicas” se encontra na frase do professor da Escola Paulista de Medicina Saul Goldenberg: “Se a precisão da linguagem é necessária a todos, ela é imprescindível aos pesquisadores e cientistas, já que a imprecisão é incompatível com a ciência.”

TCBC Alfredo Guarisch

Artigo Publicado no jornal O Globo – edição on line – dia 2/10/2018.