Artigo – Omissão de Socorro

O Código Penal brasileiro descreve o delito de omissão de socorro como deixar pessoas em situação de vulnerabilidade ou de perigo.

Há poucos dias, o governo cubano decidiu velozmente retirar seus médicos do Brasil, deixando vulneráveis brasileiros carentes. No entanto, muitos desses médicos também são vítimas ao terem sido afastados compulsoriamente de suas famílias.

Mas o que vem acontecendo com a assistência médica à nossa população carente?

Após os protestos de 2013 pela falta de políticas públicas de saúde, o governo, já com 10 anos no poder, criou o Programa Mais Médicos (PMM), acusando os médicos brasileiros indiscriminadamente de serem omissos e mercenários. 

Não é verdade.

Em 2013 tínhamos mais de 400 mil médicos atuando no Brasil e uma taxa de crescimento, nos últimos cinco anos, de 6% para a população e de 15% para os médicos. O PMM não exigia a validação do diploma dos formados no exterior e, estranhamente, o salário dos cubanos foi arbitrado em um terço do pago para os demais médicos, sendo essa diferença enviada aos cofres do governo da Ilha.

Em 1808 foi criada a primeira faculdade de medicina do Brasil, na Bahia, e nos 186 anos seguintes mais 81, a maioria pública. Nos últimos 22 anos, foram criadas 207 faculdades, a maioria particular. Apesar do número exponencial de formandos, continuam faltando médicos em inúmeros municípios e nas periferias. Isso também ocorre com dentistas, enfermeiros e outros profissionais sem os quais a medicina – uma atividade multiprofissional – é inadequada. Muitas prefeituras demitiram seus médicos, recorrendo aos pagos pelo PMM, desta forma se “libertando” desses gastos. 

A estratégia para a interiorização da medicina comete muitos equívocos, como fazer contratos desrespeitando as garantias trabalhistas e não criar uma carreira de Estado semelhante à do Judiciário. 

Uma oportunidade também foi perdida com a extinção do Projeto Rondon, nome dado em homenagem ao Marechal Cândido Rondon (1865-1958), defensor dos indígenas e da Amazônia. Começando em 1967 com uma pequena equipe de universitários e professores que conheceu a realidade amazônica, por 22 anos levou mais de 350 mil universitários a trabalharem em todas as regiões do País. O viés ideológico extinguiu o Projeto Rondon em 1989.
Não existe medicina sem médicos, da mesma forma que não existe medicina apenas com médicos.

Recentemente, a Fundação Bill e Melinda Gates, entidade sem fins lucrativos, patrocinou uma pesquisa publicada na revista médica inglesa The Lancet, na qual se concluiu que 58% de todas as mortes evitáveis em 137 países em 137 países não desenvolvidos decorrem da má qualidade do tratamento; e que essa má qualidade é o maior impedimento para a melhoria da saúde da população em países pobres. Fica claro que não basta ter um sistema de atendimento, é necessário que ele tenha qualidade.

A falta de gestão adequada e a corrupção continuam sendo as maiores causas de omissão de socorro no sistema de saúde brasileiro.

TCBC Alfredo Guarisch