As outras doenças não desapareceram

Pacientes estão chegando tardiamente e mais graves aos hospitais

ECBC Alfredo Guarischi

Nos países europeus, principalmente os nórdicos, a Inglaterra e a França, o atendimento das condições mais simples é realizado pelo médico de família – do distrito sanitário.

 Caso haja necessidade de um atendimento ou exames mais complexos o paciente é encaminhado ao local mais adequado, desde uma urgência até um hospital especializado.

Após ter seu problema resolvido o paciente retorna para o seu médico da atenção primária. A troca de informações é feita de forma constante, evitando-se consultas ou exames desnecessários.

Esses sistemas não são perfeitos, mas muito mais eficientes que o brasileiro e de muitos outros países, como os EUA. Aqui, como na América, os pacientes recorrem às emergências por um simples resfriado, para programar uma cirurgia de rotina ou mesmo para pesquisar uma anemia crônica, pela falta de atendimento na atenção básica de saúde. Na atual pandemia houve uma correta campanha para evitar que pacientes com outras viroses ou com formas leves de infecção pelo novo coronavírus procurassem as sobrecarregadas emergências.

Primeiro porque em ambos os casos o tratamento seria sintomático. Em segundo lugar pelo risco de o paciente sem corona vir a ser contaminado. A telemedicina foi liberada. O cancelamento de procedimentos não urgentes foi decretado. Houve efetiva diminuição do fluxo de pacientes as emergências. Isso foi bom? Nem tanto! Explico.

Em um artigo em 6 de abril, no The New York Times, o diretor do Yale New Haven Hospital, Dr. Harlan Krumholz, escreveu que “as emergências estão assustadoramente silenciosas, exceto pelos pacientes com Covid-19 (…) onde estão os pacientes com ataques cardíacos e derrames?”. Ele constatou que o número de admissões por infarto agudo do miocárdio foi drasticamente reduzido.

Houve uma queda de 50% no número de cateterismos de emergência e um aumento de oito vezes do número de mortes por problemas cardiológicos, em suas casas, em relação ao ano anterior. Aqui nunca atendemos tão poucos pacientes com apendicite, diverticulite, doenças cardíacas e neurológicas.

Pesquisas nos EUA, Europa e Ásia revelaram que muitos pacientes preferem ficar em casa, só buscando atendimento hospitalar depois da piora de sua condição. Está claro que nossa comunicação com a sociedade precisa ser revista, pois as outras doenças não desapareceram, e os pacientes estão chegando tardiamente e mais graves.

A maioria dos hospitais brasileiros estabeleceu fluxos e locais de atendimento diferenciados para os casos suspeitos de corona. Os demais pacientes são atendidos em outras alas. As direções técnicas seguem as normas do Ministério da Saúde e do Conselho Federal de Medicina e controlam a liberação dos procedimentos.

O uso de equipamentos de proteção individual para os profissionais de saúde ainda está sendo normalizado, mas isso não impediu que esses heróis seguissem com sua missão. Pagamos caro por isso, mas não desistimos, pois nossa profissão é salvar vidas.

A mensagem para os pacientes precisa ser clara: conversem com seu médico e não adiem o tratamento necessário; acreditem nos profissionais de saúde e nos hospitais.

Artigo publicado no O Globo 17/04/2020